Donos de clínica onde 70 pacientes foram resgatados tiveram outros estabelecimentos fechados por irregularidades, diz delegado
Conforme a investigação, há registro de denúncias de maus-tratos contra a clínica do casal em vários estados. Pacientes relatam rotina de punições e intimidação em clínica de reabilitação
O casal responsável pela clínica para dependentes químicos, que foi fechada após ser denunciada por manter 70 pacientes em cárcere privado, pode ter cometido o mesmo crime em outros estados. O estabelecimento na zona rural de Palmas foi fechado pela Polícia Civil nesta quarta-feira (7) após denúncias de maus-tratos contra os pacientes.
Os donos da clínica foram identificados como Felipe Oliveira da Veiga Lobo Colicchio e Tamara Maiara Batista Ferreira. A defesa do casal informou à TV Anhanguera que ainda não teve acesso integral ao processo e que por isso não irão se posicionar. Os dois foram levados para as Unidades Penais Masculina e Feminina da capital, onde estão à disposição da Justiça.
Conforme o Delegado Gregory Almeida, que comanda a investigação, existem registros de boletins de ocorrência no nome do casal em vários estados brasileiros, feitos por ex-internos e familiares. Segundo a polícia, os dois trocavam o local e nome da clínica.
“Essa clínica já funciona há vários meses naquele local. No entanto, a gente também está apurando que essa clínica já funcionou em outros locais e a partir de fiscalizações, seja de conselhos profissionais, de fiscalizações do Ministério Público, da Vigilância Sanitária, ela era fechada e reaberta em outros locais com outro nome, mas mantendo as mesmas irregularidades e os mesmos crimes”, afirma.
Buraco que os pacientes eram obrigados a cavar em caso de desobediências
Polícia Civil/Divulgação
Segundo o delegado, existe um histórico de clínicas de reabilitação em vários endereços que foram fechadas após denúncias semelhantes às do casal, de tortura e cárcere privado.
“Esse grupo há anos vem mantendo clínicas que eles fecham sempre após fiscalização de órgãos e reabrem em outros locais”, comenta o delegado.
Embora existam denúncias em diversos órgãos e até mesmo boletins de ocorrência contra os responsáveis pela clínica, esta é a primeira operação policial de busca e apreensão relacionada ao caso, e resultou na prisão em flagrante dos responsáveis.
Operação da Polícia Civil prende donos de clínica para tratamento de dependentes químicos
Conforme o delegado, o casal foi autuado em flagrante pelos crimes de maus-tratos, cárcere privado qualificado e furto de energia elétrica. Também há outro inquérito contra o casal pelo crime de tortura. As investigações continuam.
Entenda o caso
O resgate dos pacientes da clínica aconteceu durante uma operação da Polícia Civil na tarde desta quarta-feira (7). Ao todo, 70 homens foram encontrados e pelo menos 50 relataram que sofriam maus-tratos e tinham que tomar sedativos.
A prima de um paciente denunciou que os dependentes químicos da clínica eram colocados em um ‘buraco da punição’. “Se eles fizessem algo de errado ou passassem para o familiar o que estava acontecendo, alguma rebeldia aqui dentro, eles iam para aquele buraco e seriam punidos dentro daquele buraco”, contou Roseane Costa Santos.
Roseane é prima de um homem de 33 anos. Ele é de Marianópolis do Tocantins, na região oeste do estado, e estava internado no local há dois meses para tratar dependência química.
Buraco teria sido soterrado após operação da Polícia Civil
Polícia Civil/Divulgação
A existência do buraco também foi confirmada à produção da TV Anhanguera por um ex-interno do local. Ele pediu para não ser identificado, mas confirmou que havia agressões e contou que eram comuns surtos de pacientes psiquiátricos internados no mesmo local.
“Os pacientes entravam em surto e quando eles não davam o ‘danone’, que é uma mistura de vários tarja preta na água, ou haldol injetável, colocavam os pacientes para lavar roupa, louça ou cavar buraco de fossa […] O buraco era para servir de fossa de lixo e colocava para cavar, mas eu fiquei três meses e fiquei sabendo que quando a pessoa dava muito trabalho eles ameaçavam colocar dentro do buraco”.
A clínica funcionava em uma chácara na zona rural de Palmas. As grades nas janelas e portas, principalmente nos quartos, chamaram a atenção da equipe policial durante a operação.
Os policiais passaram quase 24 horas colhendo depoimentos dos pacientes e mais da metade confirmou as agressões físicas. Segundo os relatos, as visitas de parentes eram acompanhadas por um coordenador e os internos eram orientados do que poderiam ou não falar.
“Se desobedecessem aquele comando eles eram punidos cavando buracos na clínica ou com outros tipos de limpeza. Caso se recusassem a essa punição eles eram medicados e ficavam de um a dois dias sedados”, explicou o delegado Gregory Almeida.
Operação foi realizada nesta quarta-feira (7) na clínica, em Palmas
Kaliton Mota/TV Anhanguera
Casal preso
O casal responsável pela clínica foi preso preventivamente. Os dois foram levados para as Unidades Penais Masculina e Feminina da capital, onde estão à disposição da Justiça.
“A lei permite, sim, as internações voluntárias e as involuntárias. No entanto, a lei estabelece requisitos, como o laudo médico, como comunicação ao Ministério Público, que foi o que a gente não observou nessa clínica”.
Conforme o delegado, o casal foi autuado em flagrante pelos crimes de maus-tratos, cárcere privado qualificado e furto de energia elétrica. Também há outro inquérito contra o casal pelo crime de tortura. As investigações continuam.
Um dos quartos da clínica
Kaliton Mota/TV Anhanguera
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