Por que os legisladores estão tentando banir o TikTok em vez de fazer o que os eleitores desejam?
Os Estados Unidos estão vivendo uma polarização política. Mas há uma questão sobre a qual ambos os lados concordam: precisamos de mais privacidade, e o TikTok não deveria ser banido.
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Um número recorde de americanos – 72% – quer “mais regulamentação governamental” sobre o que as empresas podem fazer com seus dados, de acordo com um relatório de outubro do Centro de Pesquisas Pew. E apenas 31% dos americanos são a favor de uma proibição nacional do TikTok, segundo uma pesquisa de opinião feita em fevereiro pela Associated Press-Norc.
Nova lei dos Estados Unidos pode proibir a rede social TikTok de operar no país
Reprodução/Record News – 20/02
Apesar do que a opinião pública pensa, a Câmara dos EUA aprovou na quarta-feira (13), por esmagadora maioria, uma legislação que poderia forçar o TikTok a abandonar o controle de sua matriz chinesa ou ser banido. Não se sabe qual será seu destino no Senado.
A ByteDance, empresa controladora do TikTok, tem sede na China, e os legisladores americanos alegam estar buscando uma proibição em nome da proteção dos dados dos EUA contra o governo chinês. Contudo, os legisladores não estão pleiteando leis federais abrangentes sobre privacidade, que protegeriam os dados dos americanos em todos os aplicativos que usam.
Infelizmente, essa é apenas mais uma prova de como a legislação federal se distanciou da vontade do povo. Questões com amplo apoio popular, como o acesso ao aborto e o controle de armas, permanecem sem solução ao nível federal, e a maioria dos americanos afirma que as políticas governamentais não refletem a opinião pública sobre questões importantes.
Apesar dessa crescente disparidade, é de fato surpreendente que os legisladores se sintam à vontade para promover a proibição do TikTok em um ano eleitoral altamente decisivo. Afinal, um terço dos adultos norte-americanos declara usar o aplicativo, e um terço dos adultos norte-americanos com menos de 30 anos diz que recebe regularmente notícias no TikTok. Até mesmo o presidente Biden, que declarou que sancionaria a proibição caso ela chegasse à sua mesa, acabou de criar um canal no TikTok para sua campanha de reeleição.
Alguns congressistas, como o deputado Jeff Jackson, democrata da Carolina do Norte, usam regularmente o TikTok para se comunicar com seus eleitores. Jackson, que votou a favor do projeto de lei, tem dois milhões e meio de seguidores no aplicativo. “Minha mensagem para o TikTok: rompa com o Partido Comunista Chinês ou perca o acesso aos seus usuários americanos”, disse o proponente do projeto de lei, o deputado Mike Gallagher, republicano do Wisconsin.
A legislação busca impedir a distribuição nos Estados Unidos de “aplicativos controlados por adversários estrangeiros, como o TikTok”, a menos que o aplicativo seja vendido dentro de seis meses a um comprador aprovado pelo presidente dos EUA.
A pressa em aprovar esse projeto de lei é particularmente curiosa porque o governo federal já dispõe de um processo para lidar com entidades estrangeiras que compram participações em empresas nacionais. O Comitê de Investimento Estrangeiro nos Estados Unidos é um órgão interinstitucional que analisa os investimentos estrangeiros quanto a questões de segurança nacional. Por exemplo, foi uma análise do comitê que levou um comprador chinês a reverter a aquisição do aplicativo de namoro Grindr em 2020.
O comitê e o TikTok vêm negociando há anos sobre como mitigar as preocupações com a segurança nacional. Depois que o ex-presidente Donald Trump ordenou a investigação por parte do comitê, o TikTok ofereceu um plano que transferiria todos os seus dados sobre cidadãos norte-americanos para uma subsidiária nos EUA, que seria supervisionada pela Oracle. Esta também teria supervisionado os algoritmos do TikTok e as decisões de remoção de conteúdo em nome do governo dos EUA. No entanto, essa proposta foi rejeitada pelo governo dos EUA por motivos não revelados, e parece que as negociações chegaram a um impasse.
O problema é que forçar a venda do TikTok não resolveria os problemas que os legisladores afirmam estar tentando resolver. Vendê-lo para uma grande empresa de tecnologia, como Google, Meta ou Microsoft (pois, afinal, quem mais poderia pagar o preço estimado de US$ 84 bilhões?), não traria mais segurança aos dados dos americanos. Na verdade, isso simplesmente daria ao gigante da tecnologia que o comprasse um novo conjunto de informações sobre todos nós, que o novo proprietário poderia usar para aprimorar os dados já surpreendentemente detalhados.
Neste momento, por exemplo, o Google tem a maior parte dos meus e-mails, dos meus documentos, do meu comportamento de navegação na internet e do meu histórico de buscas. Os vídeos a que assisto no TikTok estão, de fato, entre as poucas coisas que ele não tem. A inclusão desses vídeos acrescentaria novos dados valiosos ao seu dossiê sobre mim e permitiria monetizá-los com anunciantes, corretores de dados e qualquer outra pessoa que use suas plataformas e seus serviços de publicidade de autoatendimento on-line.
Claro, talvez na pior das hipóteses o governo chinês esteja espionando minha visualização de vídeos do TikTok. (Este, claro, diz que a matriz chinesa é totalmente separada da entidade dos EUA.) Mas o TikTok não tem muito mais dados do que qualquer outro aplicativo – tudo que ele sabe é que passo muito tempo assistindo a vídeos de culinária e tutoriais de maquiagem. Essas informações provavelmente ajudam a China em sua busca incessante para fornecer todos os bens materiais que compro, de equipamentos de cozinha a pincéis de maquiagem. Só que o país já fabricava esses bens de qualquer forma, por isso acho que meus dados de visualização são apenas informações adicionais sobre a possível demanda futura por produtos.
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Certo, mas e quanto à lavagem cerebral que a China está promovendo por meio do TikTok? Li todas as mesmas histórias assustadoras – e tudo que posso dizer é que elas não são muito convincentes. Referindo-se à República Popular da China, o Escritório do Diretor de Inteligência Nacional declarou em sua avaliação de ameaças de fevereiro que “as contas do TikTok administradas por um braço de propaganda da República Popular da China supostamente visavam candidatos de ambos os partidos políticos durante o ciclo eleitoral de meio de mandato dos EUA em 2022”.
Isso parece assustador até considerarmos que qualquer um pode criar uma conta no TikTok para atingir qualquer pessoa durante uma eleição. Sabemos, por exemplo, que os russos criaram contas no Facebook para tentar influenciar as eleições dos EUA em 2016, e eles não precisaram comprar o Facebook para fazer isso. Também vale a pena observar que a avaliação de ameaças não alega que o algoritmo do TikTok promoveu as contas da República Popular da China – e acredito que, se tivesse provas disso, o escritório do diretor de inteligência nacional teria se manifestado.
E não está claro se a comunidade de inteligência tem provas melhores do que as que está fornecendo a portas fechadas. Depois de uma reunião de segurança nacional sobre o TikTok, voltada para membros do Congresso, a deputada Sara Jacobs, democrata da Califórnia, disse à Associated Press: “Não ouvimos nada na reunião secreta de hoje que fosse exclusiva do TikTok. São coisas que acontecem em todas as redes sociais.”
Enquanto isso, a China parece estar tendo muito sucesso ao promover sua agenda política por meio de influenciadores no YouTube, no Facebook e no Instagram, de acordo com uma investigação conduzida pela Associated Press em 2022.
É a isso que me refiro. Todas as redes sociais são campos minados de informações, repletas de conteúdo enganoso proveniente de agentes estatais, corporações, influenciadores pagos e outros. Seus algoritmos alimentam nossos piores impulsos ao destacar conteúdos que promovem a raiva e a indignação. Elas extraem nossos dados para ganhar dinheiro.
Forçar o TikTok a se fundir com outra plataforma de rede social ávida por dados não resolverá nada disso. A solução é estabelecer regras básicas de privacidade que proíbam as empresas de explorar nossos dados e que nos deem controle sobre os algoritmos que utilizam para nos manipular.
(Julia Angwin é colaboradora da seção de Opinião do “The New York Times” que escreve sobre política de tecnologia.)
c. 2024 The New York Times Company
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